Mais da metade (53,6%) das pessoas presas em flagrante responde por crimes patrimoniais ou relacionados a drogas, como tráfico, associação para o tráfico, porte/uso de drogas e outras tipificações. Os dados são do Sistema de Audiência de Custódia (Sistac) que também permitem fazer um recorte por raça: pessoas negras correspondem a 64,3% dos presos em flagrante, enquanto a população branca representa 35%. As informações constam dos dois primeiros Boletins de Audiência de Custódia e se referem ao período entre 2015 e 2024. Os boletins serão publicados trimestralmente pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ).
De 2015 a 2024, foram realizadas 1,6 milhões de audiências de custódia, tornando mais ágil a avaliação das prisões em flagrante
Criadas pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ) em 2015, as audiências de custódia têm, como principal objetivo, garantir um direito básico a qualquer pessoa que acaba de ser detida: sua rápida apresentação a um juiz ou juíza, que analisará a legalidade do flagrante e decidirá sobre a manutenção da prisão ou a aplicação de penas alternativas. Desde 2019, o fortalecimento e a qualificação das audiências fazem parte das ações do programa Fazendo Justiça, executado pelo CNJ em parceria com o Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud). Neste período cerca de 1,6 milhão de audiências de custódia foram registradas, sublinhando a importância da prática na avaliação de prisões em flagrante.
Neste contexto, o Sistema de Audiência de Custódia (Sistac) acabou por se tornar uma fonte relevante de dados, que, agora, serão disponibilizados por meio dos boletins trimestrais do CNJ. As informações revelam disparidades que chamam a atenção. Há uma maior representação de pessoas negras presas em flagrante em relação a esse contingente populacional na sociedade brasileira, assim como os brancos estão sub-representados.
Essa questão é um dos problemas abordados no Pena Justa, plano de enfrentamento ao estado de violações massivas de direitos nas prisões brasileiras construído pelo CNJ, pela Secretaria Nacional de Políticas Penais (Senappen) e por diversos parceiros institucionais. A formulação do plano cumpre decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) na Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 37 e resultará em processos locais desenvolvidos em conjunto com as unidades da federação.
Os relatos de tortura ou maus-tratos trazidos nas audiências de custódia somaram 9% no primeiro bimestre de 2024. Mas as ocorrências variam de acordo com a raça/cor dos detidos, com a população negra registrando o maior percentual (12,8%). Esses dados reforçam a necessidade de um olhar mais atento para as condições de detenção.
As audiências de custódia, que se tornaram obrigatórias para prisões em flagrante no prazo de 24 horas a partir da decisão do Supremo Tribunal Federal em 2015, foram regulamentadas pela Resolução CNJ n. 213/2015. Desde então, cada unidade da federação adotou suas próprias rotinas para a realização dessas audiências, o que criou desafios para a uniformização do processo em todo o país, dadas as diversas realidades locais.
Em 2020, o CNJ lançou o Manual de Proteção Social na Audiência de Custódia , uma publicação técnica que sistematiza os parâmetros de atuação, em conformidade com as Resoluções CNJ n. 213/2015 e n. 288/2019. Esta última estabelece a política institucional do Poder Judiciário para a promoção da aplicação de alternativas penais.