A tarde da segunda-feira, 6/julho, Seminário de Verão, em Coimbra (Portugal), foi marcada por dois painéis cujo tema de ambos foi uma questão: “Que papel para as diversas jurisdições?”. Jurisdições não mais são do que o poder que detém o Estado para aplicar o direito ao caso concreto, com o objetivo de solucionar os conflitos de interesses e, com isso, resguardar a ordem jurídica e a autoridade da lei.
O primeiro painel contou com os ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ) brasileiro Paulo Moura Ribeiro, Paulo de Tarso Sanseverino e Marco Aurélio Buzzi, e ainda o Conselheiro português José Narciso da Cunha Rodrigues, além da moderação do professor catedrático da Universidade de Coimbra, António Barbosa de Melo. Já a segunda mesa teve a mediação do desembargador do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de Janeiro Agostinho Teixeira Filho, entre os convidados o advogado e Diretor Jurídico da Itaipu, Dr. Cezar Eduardo Ziliotto e o ministro do STJ Ricardo Villas Bôas Cueva.
Marco Aurélio Buzzi, ministro do STJ, abriu a mesa de debate abordando a política institucional dos meios adequados de resolução de conflitos. “Quando se propõe desconstruir algumas noções de jurisdições, não se está necessariamente propondo erradicar algo posto, que é a ação judicial, uma das maiores conquistas da sociedade moderna. Nós estamos pensando em ampliar as noções do que possa ser compreendido como entrega da jurisdição”, disse Buzzi. O ministro concluiu da seguinte forma: “Os juristas precisam reconhecer que as cortes não são a única forma de resolução de conflitos, nem a única forma de distribuição da prestação jurisdicional”.
Em contrapartida, o conselheiro José Narciso da Cunha Rodrigues falou sobre a justiça como missão, pensamento, como modo de estar do juiz, do advogado. “Na Europa costuma dizer que temos uma geração que vive pior do que a geração dos seus progenitores. Por outro lado diz-se que nunca houve tanto direito como há hoje. Mas não é verdade que os direitos têm um preço? Cada direito representa um custo. Nós, juristas, não ignoramos este dado. Mas o que aconteceu na Europa foi o movimento da desconstrução do Direito. (…) O papel dos juristas foi substituído por outros atores, que tendem a hostilizar o Direito e se apropriaram da linguagem das ciências exatas. Porque é fácil de acreditar nos números, porque os números não enganam. Hoje na Europa a linguagem dos números é um veiculo de comunicação”, afirmou Rodrigues.
O também ministro do STJ, Paulo Moura Ribeiro, trouxe dados da Fundação Getúlio Vargas em relação a uma pesquisa realizada pela instituição no Brasil que mostrava a aceitação do judiciário brasileiro pela população, demonstrando que 58,3{89cb47d5f2a6939f58b3044232c1148b625258756ccb0aca85adbdc5ae11d782} acreditam que o acesso ao judiciário no Brasil é difícil ou inexistente e que 59{89cb47d5f2a6939f58b3044232c1148b625258756ccb0aca85adbdc5ae11d782} acreditam que o judiciário brasileiro não é competente na resolução de conflitos. “Segundo a OAB temos 875 mil advogados no Brasil, mas não importa se temos mais advogados aqui do que em qualquer outro país do mundo, pois temos demanda para isso. Assim como precisamos de mais médicos também precisamos de mais bacharéis em Direito”, disse Moura Ribeiro, destacando que o Artigo 190 do Novo Código do Processo Civil traz a possibilidade da solução negociada de conflitos e vai de encontro ao Código de Processo Civil português.
O primeiro dia de palestras também contou com a participação do ministro do STJ Paulo de Tarso Sanseverino, que abordou a mediação, a conciliação e a arbitragem como métodos alternativos de solução das demandas de consumo. Ele explica: “A conciliação não se preocupa com a causa do problema, mas sim em resolver o problema e o juiz pode atuar como conciliador. É um método consagrado dentro do processo judicial brasileiro em todos os setores do poder judiciário. A mediação é um método alternativo que surgiu nos Estados Unidos mais complexo do que a conciliação, pois possui foco na própria causa dos conflitos. O mediador deve ser um terceiro neutro e imparcial, não podendo o juiz atuar como mediador.” O ministro completa: “A arbitragem deixou de ser um ponto polêmico, porque na revisão da Lei de Arbitragem havia a possibilidade dela ser usada na resolução de demandas de consumo, mas foi vetada pela Presidência da República. Suas características são: a possibilidade de uma heterocomposição de conflitos fora do poder judiciário, mediante a indicação pelas partes de um árbitro para estabelecer a solução”.
O advogado Dr. Cesar Eduardo Ziliotto destaca que “a jurisdição no Brasil é muito cara pra muitos e muito barata, no sentido e custo para se manter uma ação judicial, para poucos.” Seguindo em frente, foi a vez do ministro do STJ Ricardo Villas Bôas Cueva encerrar as atividades do dia. Ele se referiu ao controle da convencionalidade no Brasil, tema pouco explorado na doutrina e na jurisprudência, mas que já tem sido estudado. “Quando viajamos pela América Latina fala-se muito sobre o controle da convencionalidade como motor da promoção dos direitos humanos, que é o controle da compatibilidade do direito interno com os tratados internacionais de Direitos Humanos. Esse tema remete àquela discussão entre monismo e dualismo, para saber o que tem a supremacia: a constituição ou o Direito internacional? Nos países latinoamericanos essa problemática tem tido uma validade enorme, sobretudo quando se trata das leis de anistia e da proteção dos povos indígenas. No Brasil, os tratados internacionais têm tido eficácia de lei ordinária, portanto podem ser modificados, é o que a doutrina chama de monismo temperado”, afirmou o ministro.
A terça-feira, 7 de julho, contou com uma mesa de debates sobre o papel da arbitragem e outra sobre a liberdade de circulação e os seus desafios, seguida da conferência de encerramento com a Ministro da Justiça do Brasil, José Eduardo Cardozo, e ainda um jantar conferência com o Ministro do Supremo Tribunal Federal Marco Aurélio Mello.
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